Pesquisa com a variedade considera fatores como clima, solo e desempenho agronômico.

Acontece no Sudeste brasileiro um trabalho inédito no país que busca identificar o potencial produtivo e de qualidade da videira ‘Syrah’. Esta é uma das variedades mais antigas e cultivadas do mundo. Há uma divergência se ela teria surgido no Egito ou na França. O fato é que o êxito dessa uva ao redor do mundo é atribuído à sua grande adaptabilidade, que permite que ela seja cultivada com ótimos resultados em diferentes terrenos, climas e altitudes. Como consequência, é possível encontrar ótimos vinhos com rótulos franceses, de uvas cultivadas em clima mediterrâneo, australianos, provenientes de regiões muito quentes, e até chilenos, de frutas colhidas em temperaturas mais baixas.

Agora a Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais (EPAMIG) e o Departamento de Ciência do Solo da Universidade Federal de Lavras (DCS/ Ufla) busca observar as  características edafoclimáticas, do desempenho da videira e da composição das uvas, pontos fundamentais para melhorar o conhecimento sobre a tipicidade dos vinhos de inverno

“A interação entre os fatores naturais de solo, clima e planta e fatores humanos como escolha da variedade, tipo de manejo e práticas enológicas, que são empregadas no processo de elaboração, influenciam na qualidade final do vinho e na definição do terroir, bastante usado para agregar valor ao vinho e a outros produtos”, argumenta a pesquisadora da Epamig, Cláudia Rita Souza.

O acompanhamento se deu durante três safras, de 206 a 2018, em vinhedos comerciais de Três Corações, Três Pontas, Cordislândia, São Sebastião do Paraíso e Andradas, no Sul de Minas, e Itobi e Espírito Santo do Pinhal, no interior de São Paulo. Os vinhedos selecionados tem idade superior a dez anos e arquitetura da planta formada. Como resultado foi observado que essa a variedade que apresentou melhor vigor vegetativo e um ótimo potencial de produção e qualidade da uva e dos vinhos, nos vinhedos submetidos à dupla poda, que é o manejo necessário para induzir a colheita de inverno.

Este projeto é pioneiro em fazer um estudo detalhado sobre os solos destinados à vitivinicultura. Nas regiões vitícolas mais tradicionais no mundo, os estudos geológicos são mais empregados para a caracterização do terroir. No Sudeste do Brasil, entretanto, devido às elevadas temperaturas e ao nível de precipitações, os solos, mais intemperizados, apresentam menor relação direta com a rocha de origem.

“Além do emprego da dupla poda, outra diferença notável são os atributos do solo. Em regiões produtoras de clima temperado como França, Portugal e Itália, os solos são mais rasos, arenosos, ou pedregosos, o que garante o déficit hídrico requerido pela videira. Já nos municípios de Cordislândia, Três Corações, Três Pontas e São Sebastião do Paraíso, a produção da videira ocorre sobre os Latossolos, que são solos muito profundos, argilosos e com estrutura granular. A presença desse tipo de em subsuperfície só ocorre em Latossolos do Brasil. E acredito que seja exatamente tal atributo que impõe uma excelente drenagem nestes solos e permite a produção de vinhos de qualidade tão elevada e que conquistam tantos prêmios, mesmo em solos argilosos e profundos”, avalia a doutoranda em Ciências do Solo pela Universidade Federal de Lavras, Mariana Gonçalves.

Ela destaca que três tipos de solo foram encontrados nas regiões estudadas: os Latossolos (profundos); os Argissolos (com profundidade mediana e estrutura em blocos) e os Cambissolos (mais rasos e em blocos). “Os vinhedos foram agrupados de acordo com os tipos de solo e verificamos que dentro de um mesmo grupo ocorrem altitudes e precipitações semelhantes: Cambissolos – menor altitude e menor nível de chuva; Latossolos – altitude e precipitações moderadas; Argissolos – altitudes mais elevadas e maior quantidade de chuvas”.

Após as avaliações de campo, já finalizadas, o estudo contará com as etapas de análise sensorial e dos compostos aromáticos dos vinhos produzidos nas três safras acompanhadas. “As análises dos atributos aromáticos serão feitas por cromatografia gasosa, que é uma técnica que permite identificar os compostos químicos voláteis, que são precursores dos aromas dos vinhos. Já a etapa de análise sensorial é fundamental para avaliar se na taça são percebidas diferenças não detectadas nas análises químicas.

Em breve, esses vinhos serão avaliados por um painel de degustadores experientes, que irão conferir diferentes notas para atributos como cor, estrutura, sabor e aroma, aos vinhos ‘Syrah’ produzidos nos vinhedos estudados”, informa Cláudia Souza.

Os dados levantados vão contribuir para o setor possibilitando que, em um futuro próximo, associações de produtores e vinícolas utilizem as informações para solicitação de Indicação Geográfica (IG) dos vinhos de inverno. “O pedido junto ao Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI) requer o preenchimento do caderno de especificações técnicas que, dentre outras informações, deve conter a caracterização ambiental com dados de clima e solo”, explica Mariana Gonçalves, acrescentando que, o Vale dos Vinhedos, no Rio Grande do Sul, foi a primeira região a conquistar a Indicação de Procedência (IP) no Brasil, no ano de 2002. Desde 2012, a região possui a Denominação de Origem. “Os Vales dos Vinhedos têm mapa detalhado de solos, o que auxilia na tomada de decisão de manejo de solos e no apoio para a determinação de áreas com maior aptidão para a vitivinicultura”, completa.

Fonte- AGROLINK

Por- Eliza Maliszelski